Opiniões e perspectivas

A escola ainda produz jovens analfabetos funcionais

Sala de aula antiga, vazia.
Publicado: 03/03/2020
Equipe Inaf

Aumento da escolarização colabora diretamente para a redução do analfabetismo funcional, mas como a qualidade da educação é baixa, o país não garante os índices de alfabetismo desejáveis

A escolarização do jovem é cada vez maior no Brasil. Em apenas cinco anos, a média de escolaridade entre a população que tinha entre 18 e 25 anos subiu de 9,7 para 11,3 anos, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad Contínua) de 2012 e 1017, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Fruto de conquistas democráticas no campo da Educação nas últimas décadas, esse fato colaborou para que o analfabetismo funcional fosse reduzido ano a ano para a população que se encontra nessa faixa etária.

Porém, somente a escolarização não garante, por si só, os níveis de alfabetismo desejados para todos os indivíduos. Segundo dados do Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) de 2018, entre os jovens de 15 a 29 anos com Ensino Superior completo, 4% ainda estão na faixa dos considerados analfabetos funcionais e 20% encontram-se no nível elementar – o mais baixo entre os três que compõem a faixa do alfabetismo funcional. Cerca de 76% dessa população está no nível consolidado (intermediário + proficiente), quando o desejável é uma taxa próxima de 100%. Esses números mostram a urgência de buscar mais qualidade na Educação oferecida às crianças e aos jovens que acessam os sistemas educacionais.

Quando se observa a porcentagem de jovens analfabetos funcionais que não acessaram a escola (5%) e também a dos que tiveram essa oportunidade mas evadiram nas séries iniciais do Ensino Fundamental (23%) [os dados para o total de jovens são: 1% não acessou a escola e 5% evadiram nos anos iniciais do Fundamental] , o desafio é ainda maior: como atrair novamente esses indivíduos para o sistema educacional para que saiam da condição de analfabetos ou analfabetos funcionais? Além disso, algumas iniciativas poderiam trazer resultados semelhantes ao da escola: visto que 43% dos jovens pertencem a algum tipo de organização social, cultural ou política, esses espaços poderiam assumir a responsabilidade de ser, também eles, promotores de letramento e numeramento.

Do total de jovens considerados analfabetos funcionais, a maioria declara-se do sexo masculino (56%). Embora 37% esteja trabalhando (aqui as empresas poderiam se encarregar de promover iniciativas de alfabetização), ainda há uma grande parcela de desempregados (27%) e outra de jovens procurando emprego pela primeira vez (7%). Afirmam ser donas de casa 11% da amostra pesquisada. Cerca de 62% vivem em famílias com renda média mensal inferior a dois salários mínimos e 54% moram em cidades do interior do país. Para essas pessoas, a ação do estado via escola ainda parece ser fundamental.

Dos 34% de jovens de 15 a 29 anos que têm alfabetismo elementar, 40% declaram ainda estar estudando. Esses, portanto, terão mais chances de continuar desenvolvendo o letramento e o numeramento para que alcancem os níveis intermediário e proficiente. Com esse grupo, usar o potencial das novas tecnologias para promover o alfabetismo pode ser eficiente, afinal, 93% utilizam o telefone celular e 91% acessaram a internet pelo menos uma vez nos três meses que antecederam a pesquisa.

 

Destaques

Dos indivíduos com nível proficiente,
49% têm entre 15 a 29 anos.

Dos indivíduos com nível intermediário,
50% têm entre 15 a 29 anos.

Dos jovens de 15 a 29 anos,
49% têm alfabetismo consolidado (níveis intermediário e proficiente).
14% são analfabetos funcionais.

Dos jovens de 15 a 29 anos que estão trabalhando,
58% têm alfabetismo consolidado.
11% são analfabetos funcionais.

Plataformas on-line de vídeos são acessadas por
91% dos jovens de 15 a 29 anos com alfabetismo consolidado.
57% dos jovens de 15 a 29 anos considerados analfabetos funcionais.

Pertencem a alguma organização social
43% dos jovens até 25 anos.

 

O Inaf também está no Futura

Assista aos vídeos da série especial Alfabetismo Brasil, no Canal Futura, com a participação de diversos especialistas que comentam os resultados do Inaf 2018.

Episódio sobre juventude.

 

Palavra de especialista

“Os jovens que estão escolarizados, em proporções muito maiores que seus pais e avós, serão melhores trabalhadores e também melhores pais, eleitores, consumidores e pacientes. O problema é que ainda há um número expressivo de analfabetos funcionais entre eles, mesmo estando mais escolarizados.”

Ana Lima, economista, fundadora da Conhecimento Social

“Alfabetismo significa lidar com um conjunto mínimo de habilidades de compreensão, codificação e produção com o alfabeto, ou seja, com a escrita. Talvez o índice de alfabetismo funcional, num primeiro momento, piore, uma vez que a mensagem chega cada vez menos somente pelo texto e cada vez mais de forma multiletrada, em vídeos, imagens e novas mídias.”

Roxane Rojo, professora de linguística

Conheça o Inaf

O Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) é um estudo de alcance nacional, realizado desde 2001, que estima os níveis de alfabetismo funcional da população e investiga seus determinantes. Parceria entre o Instituto Paulo Montenegro e a ONG Ação Educativa, a iniciativa é coordenada pela Conhecimento Social. O levantamento é feito por meio de entrevista pessoal e teste cognitivo aplicado a uma amostra representativa da demografia e da diversidade socioeconômica e geográfica da população brasileira que está entre 15 a 64 anos.

De acordo com o Inaf, o indivíduo é funcionalmente alfabetizado quando apresenta um determinado grau de proficiência em letramento e numeramento. O letramento é a habilidade de ler e escrever diferentes gêneros, em diferentes suportes e formatos, com coerência e compreensão crítica. O numeramento é a habilidade de construir raciocínios e aplicar conceitos numéricos simples, ou seja, usar a matemática para atender às demandas do cotidiano. É por meio dessas capacidades que o indivíduo terá plenas condições de participar ativamente da sociedade em seus mais diversos âmbitos.

Os resultados do Inaf localizam a população pesquisada em cinco níveis de alfabetismo. Nos dois primeiros – analfabeto e rudimentar – agrupam-se os chamados analfabetos funcionais. Nos três níveis seguintes – elementar, intermediário e proficiente – concentram-se os indivíduos considerados alfabetizados funcionalmente.

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